Nanotecnologia ajuda no controle de uma das principais doenças de caprinos e ovinos

20 de fevereiro de 2023

Técnicas de nanotecnologia estão sedo utilizadas para controlar a linfadenite caseosa, doença também conhecida como “mal do caroço”, que atinge caprinos e ovinos em todas as regiões do país.

A pesquisa conduzida em parceria entre a Embrapa e a Universidade Federal de Lavras (Ufla) consiste em um tratamento de uso racional de antibióticos aplicados diretamente na área afetada por meio de nanopartículas e nanofibras.

Os principais benefícios do novo procedimento são a biossegurança e a diminuição do resíduo de antibiótico no leite e na carne oriundos desses animais.

O tratamento disponível atualmente envolve um manejo trabalhoso e gera custos com mão de obra e medicamentos, tornando-se pouco viável para rebanhos numerosos, além de apresentar riscos de contaminação para o manejador e o meio ambiente.

O “mal do caroço” é uma doença bacteriana infectocontagiosa que promove a formação de abscessos em linfonodos superficiais (gânglios linfáticos) ou em linfonodos e órgãos internos do animal.

A enfermidade está presente em 94,2% dos rebanhos de ovinos e em 88,5% dos rebanhos de caprinos na região Nordeste, onde se localiza a maior produção desses animais.

Procedimentos

O tratamento convencional do abscesso maduro consiste na drenagem cirúrgica do conteúdo purulento do caroço, seguida da cauterização química da ferida com tintura de iodo a 10% por, pelo menos, dez dias.

Caso o procedimento seja feito de forma incompleta, o abscesso pode voltar a aparecer na mesma região após alguns meses. O custo desse tratamento para o produtor é de aproximadamente R$ 86 por animal.

As opções disponíveis, além de terem alto custo para o produtor, são trabalhosas e não têm 100% de eficiência na eliminação do agente infeccioso no abscesso.

Uso racional

O tratamento com iodo ainda apresenta risco de contaminação tanto para o manejador quanto para o meio ambiente, uma vez que requer a abertura do caroço e a drenagem do conteúdo, que possui alta carga bacteriana. Como a linfadenite caseosa é uma zoonose, pode ser transmitida para o ser humano.

O tratamento que está sendo desenvolvido pela Embrapa e Ufla avalia o uso racional de antibiótico priorizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a cloxacilina, maximizando a biossegurança e reduzindo o risco ambiental.

De acordo com a pesquisadora da Embrapa Caprinos e Ovinos Patrícia Yoshida, que lidera o projeto, o resultado esperado é a cura do abscesso precoce, sem a necessidade de abertura e exposição ao material purulento.

“O novo tratamento consiste em administrar altas concentrações de antimicrobiano diretamente no abscesso, mesmo com baixas concentrações nos demais tecidos e sangue. Dessa forma, espera-se menor resíduo de antibiótico no leite e carne desses animais”, explica.

Os pesquisadores utilizam a nanotecnologia para desenvolver duas novas opções de procedimento. Para o abscesso fechado, ainda no início da doença, está sendo testado o uso de nanopartículas, que têm a capacidade de direcionar o antibiótico para o interior das células infectadas pela bactéria causadora da linfadenite caseosa, para obter uma concentração maior do medicamento no local, o que pode favorecer o combate ao patógeno.

“A bactéria se ‘esconde’ no interior das células de defesa do caprino, local onde muitas vezes o antibiótico não consegue atingir concentrações suficientes para eliminá-la. Por isso, muitas vezes ela sobrevive ao tratamento. Ao utilizarmos as nanopartículas para direcionar o antibiótico para o interior das células de defesa, conseguimos aumentar sua concentração nesse local e assim tornar o medicamento mais eficiente”, explica o pesquisador Humberto Brandão, da Embrapa Gado de Leite.

A outra opção é o uso de nanofibras para o tratamento do abscesso maduro após a drenagem, em substituição à tintura de iodo a 10%, de modo a eliminar a bactéria e favorecer a cicatrização.

“As nanofibras são ferramentas bastante interessantes para aplicações médico-veterinárias, pois podem ser produzidas com materiais biocompatíveis com elevada área de superfície e porosidade, que mimetizam a matriz extracelular, e permitem carregar grandes quantidades de fármacos, possibilitando sua liberação de forma lenta no sistema”, relata o pesquisador da Embrapa Instrumentação Daniel Corrêa.

Na Ufla, estão sendo desenvolvidos modelos computacionais com base nos resultados obtidos com animais para determinar com precisão os protocolos (doses e intervalos) de tratamento. O pesquisador Marcos Ferrante explica que trabalhar com modelos computacionais permite simular diferentes cenários, diminuindo o número de animais usados na pesquisa, além de maximizar o uso dos recursos financeiros.

“Essas pesquisas permitirão otimizar as doses para protocolos terapêuticos em diferentes cenários produtivos, possibilitando aos produtores tratar os animais com a mínima quantidade de antibiótico necessária e sem comprometer a eficácia do tratamento”, complementa Ferrante.

Difusão depende de parceiros

Atualmente, o desenvolvimento da nova técnica está em fase de testes com caprinos para definir a melhor forma de uso do produto. Segundo Yoshida, a equipe espera concluir os ensaios com os animais em condições controladas nos próximos três anos e encontrar parceiros na indústria farmacêutica para viabilizar a produção em larga escala para comercialização.

“Estamos prospectando parceiros para colocar o produto no mercado. A parceria com essa formulação pode ser em codesenvolvimento desse e de outros medicamentos. O parceiro interessado entraria com a expertise e infraestrutura de linha de produção, capaz de receber a tecnologia de formulações nanotecnológicas para uso farmacêutico. Essa tecnologia mostra potencial, visto que já foi testada em outras espécies animais e infecções, como mastite e ceratoconjuntivite em bovinos”, afirma a pesquisadora.

Impactos da doença
A presença da linfadenite caseosa no rebanho traz diversos prejuízos para o criador, como queda na produção, aumento do custo com mão de obra e medicamentos para o tratamento, desvalorização da carne e da pele do animal, além de causar a morte de caprinos e ovinos quando a doença está muito disseminada no rebanho. Outro prejuízo importante é o descarte de carcaças (ou partes delas) e vísceras no frigorífico, podendo também impossibilitar a exportação da carne.

Controle e prevenção

– Ao comprar os animais, o produtor deve colocá-los em quarentena para observar o aparecimento de abscessos e tratá-los antes de inseri-los no rebanho. Os produtores não devem compartilhar animais (reprodutores).
– Os animais com abscessos antes da ruptura devem ser separados e isolados.
– O corte cirúrgico do abscesso deve ser seguido de cauterização química da ferida.
– O animal somente deve retornar ao rebanho após a completa cicatrização da ferida.
– Todos os casos de linfadenite no rebanho devem ser anotados, com a identificação do animal, data em que teve a doença e localização.
– As instalações devem ser desinfectadas com cal hidratada ou vassoura de fogo.
– Animais que apresentam mais de um abscesso em sua vida produtiva devem ser descartados (sacrifício ou abate).
– As carcaças dos animais mortos devem ser levadas para compostagem.
– A carne de animais com abscessos não deve ser consumida. A linfadenite caseosa é uma zoonose e pode ser transmitida aos seres humanos.