Carne de pato: empresa catarinense bate recorde de exportação e domina 90% do mercado no Oriente Médio

22 de novembro de 2021

O que têm em comum os patinhos criados em um colégio de Santa Catarina para fazer a limpeza das quadras de arroz antes da semeadura, o Japão e a colônia alemã no Estado ao sul do Brasil? Eles fazem parte da origem da maior produtora e exportadora de patos da América Latina e sexta maior exportadora do mundo da ave inteira, a Villa Germania Alimentos, localizada no município de Indaial, que, aproveitando a onda gourmet mundial das proteínas, vem batendo recordes de embarques para o exterior, destino de 67% da sua produção.

Em agosto deste ano, as vendas externas da empresa ganharam mais um incentivo, com a criação do selo Brazilian Duck (“pato brasileiro”, em tradução livre) pela Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil).

O novo selo, que já provocou barulho em duas feiras internacionais, atesta credibilidade, qualidade, sanidade, sustentabilidade e saudabilidade da carne de pato brasileira para um mercado premium, com foco especial em países do Oriente Médio, onde a empresa catarinense domina 90% do mercado, e da Ásia. O Brazilian Duck junta-se às iniciativas anteriores de promoção no exterior das proteínas nacionais: Brazilian Chicken, Brazilian Pork, Brazilian Eggs e Brazilian Breeders (material genético).

Em 2020, as exportações de carne de pato atingiram 3,5 mil toneladas, segundo dados do Agrostat, serviço de estatísticas sobre comércio exterior do Ministério da Agricultura, com uma receita de US$ 9,2 milhões. Neste ano, a empresa de 25 anos, que é a única do setor no Brasil e tem habilitação para vender carne de pato para mais de 80 países, prevê embarcar 4,5 mil toneladas. De quebra, vê aumentar o consumo dessa proteína premium no Brasil, especialmente em São Paulo, Rio de Janeiro e Belém, onde é famoso o pato com tucupi servido, principalmente, no feriado do Círio de Nazaré.

Além de colocar seus produtos em gôndolas das grandes redes de supermercado a preços também premium (480 gramas de coxa e sobrecoxa, por exemplo, custam mais de R$ 40 em supermercados consultados pela reportagem), a Germania mantém parcerias com chefs como Alex Atala (SP), Leo Paixão (MG) e Yann Kamps, do Instituto Le Cordon Bleu, do Rio.

A expectativa da indústria de Santa Catarina, que teve alta de 132,5% na receita no primeiro semestre, é fechar 2021 com uma receita líquida de R$ 150 milhões, quase o dobro em comparação ao ano passado, e um lucro líquido de R$ 15,8 milhões.

A chegada a esses números foi cheia de altos e baixos, de avanços e crises, que quase levaram a empresa à falência, como ocorreu com duas concorrentes, segundo o vice-presidente de operações, Marcondes Aurélio Moser, que falou com a Globo Rural por vídeo, direto de Colônia, na Alemanha. O executivo participou da maior feira de alimentos do mundo, a Anuga, para divulgar a empresa e a marca Brazilian Duck.

Fundada em 1996, a Villa Germania nasceu da demanda da comunidade alemã de Santa Catarina por um prato típico: o marreco (ou pato) recheado. Na época, a empresa comprava os patinhos de um colégio agrícola, criava-os em barracões ao lado da indústria e abatia 50 por dia só para atender ao mercado local. Após três anos, começou a importar genética de patos-de-pequim da França, com foco em precocidade de abate, peso e eficiência alimentar; desativou os barracões e iniciou a verticalização, com a contratação de integrados a um raio de até 150 quilômetros, para criar as aves.

Em 2004, com a gripe aviária abalando a Ásia, o Japão passou a buscar novos fornecedores no mundo e encontrou a Villa Germania, que tinha obtido a primeira habilitação para exportar um ano antes. “Com um pedido de 6 mil patos por dia, eles nos incentivaram a expandir a produção de 1.000 abates diários para 7.500. Cerca de um ano depois chegou a conta, e descobrimos na prática o risco de colocar todos os ovos, quer dizer os patos, em uma cesta só”, diz Marcondes.

O país asiático começou a fazer barganha no preço e colocou mais exigências para importar a carne brasileira. “O dólar caiu, o Japão ficou inviável, tivemos de cancelar o contrato e dar um passo atrás.” A participação em feiras como a Anuga começou a abrir portas para a Germania no Oriente Médio, que recebeu muitos imigrantes, especialmente egípcios, que consomem pato regularmente.

A empresa já tinha a certificação halal, condição necessária para exportar para os países muçulmanos, e investiu, então, na habilitação específica para atender à Arábia Saudita, que passou a ser o principal mercado para o pato brasileiro. Em 2010, quando abatia de 5 mil a 6 mil aves por dia, a empresa decidiu abrir o capital para renovar e ampliar sua indústria. Naquele ano, diz Marcondes, o trem da Germania corria em alta velocidade, mas acabou batendo em um paredão.

Quem explica a “trombada” é o vice-presidente corporativo, o carioca José Armando Nogueira Pinto, que veio do mercado financeiro, de um grande banco, para gerir os investimentos do fundo na indústria, se encantou com o negócio e hoje vive na ponte aérea Rio-Navegantes (cidade catarinense que fica a 73 quilômetros de Indaial). Segundo ele, a empresa recebeu recursos, mas se endividou com empréstimos para financiar a nova planta e ainda teve de enfrentar um momento de grande elevação de custos, descasado com as vendas no mercado externo e potencializado pela crise de grãos (que é a base da ração) em 2012.

Foto: Ricardo Benichio

 

Fonte: Globo Rural